A PRAGA DE GAFANHOTOS

Robert Kurz

Não é segredo nenhum que o nível intelectual da classe política anda mais ou menos à altura do discurso das tabernas de província. Por isso, o secretário-geral do SPD Müntefering apenas conseguiu aquecer o coração arrefecido do seu partido com uma "crítica do capitalismo" que certamente fez Karl Marx dar voltas no túmulo. Em vez de criticar o modo de produção capitalista, ao qual já há muito tempo também o SPD aderiu incondicionalmente, Müntefering julgou encostar-se à vox populi e extrair dividendos eleitoralistas ao insurgir-se, de forma simplista e isolada, contra o capital financeiro especulativo dos hedge funds como "praga de gafanhotos". Este discurso já nem sequer é populista de esquerda, mas sim claramente populista de direita. Até os sindicalistas de esquerda da "Labournet" ficaram horrorizados com o facto de o velho vocabulário nacional-socialista, com forte carga antisemita, do bom capital "criador" e do mau capital "rapinante", se ter infiltrado no discurso social-democrata e sindical.

No entanto, a mera caracterização retórica desta espécie de "crítica do capitalismo" como "romba e obtusa" permanece ela própria impotente e barata, se não for capaz de explicar quais são os desenvolvimentos sociais que estão na base do alastramento de semelhante linguagem populista de direita até ao âmago do partido de esquerda SPD e do sindicato dos metalúrgicos IG Metall. Se dermos uma vista de olhos nas análises teóricas do marxismo residual tradicional e académico dos últimos dez anos, facilmente reencontraremos o tom funesto de Müntefering. É um facto que algo de semelhante também existiu no vocabulário de agit-prop do velho movimento operário, mas em termos teóricos este nunca desceu tão baixo. Rudolf Hilferding, o teórico marxista clássico do capital financeiro, não encarou a ascensão deste como uma "praga de gafanhotos", mas como um importante passo em direcção ao socialismo, porque por seu intermédio a socialização da reprodução no seu todo alcançaria um grau de organização mais elevado. O movimento operário, politicamente arregimentado, teria apenas de deitar mão a esta socialização já preparada pelo capitalismo financeiro e assim inaugurar o estado operário. Evidentemente esta ideia era ela própria simplista, tendo ficado arrumada com o desmoronamento do socialismo de estado. Os marxistas tradicionais residuais já não podem voltar a requentar as ideias de Hilferding. Mas como não avançaram para uma crítica mais radical do moderno sistema produtor de mercadorias e do seu "trabalho abstracto" (Marx), o castigo é terem ficado para trás de Marx e Hilferding, com uma "crítica do capitalismo" pequeno-burguesa que diaboliza o capital financeiro "rapinante".

Esta perigosa reviravolta ideológica com aproximação a um "antisemitismo estrutural" não deixa de ter uma base social. Com a crise do "trabalho abstracto" também se decompõe a velha classe operária industrial. A pobreza já não assenta no trabalho produtivo capitalista; cada vez mais salario-dependentes precarizados têm de lutar por uma sobrevivência miserável como "agentes da circulação". Com as biografias do ganha-pão a oscilarem em massa entre o trabalho assalariado na circulação, rendimentos provenientes das transferências estatais e uma independência aparente, sociedade unipessoal etc., os indivíduos apresentam-se como "empresários da sua força de trabalho". Mesmo sem a posse de pequenos meios de produção exteriores, o próprio corpo converte-se em capital humano e cada ser humano se torna, por assim dizer, o "pequeno-burguês de si mesmo". Assim talvez seja precisamente na nova classe média em queda (de gente com qualificações de alta tecnologia até médicos, assistentes sociais etc.) que surge uma receptividade para ideologias neo-pequeno-burguesas da pior espécie. Müntefering andou a brincar com esse fogo. Um pensamento de esquerda crítico da sociedade, que não se opõe com determinação a esta "crítica do capitalismo" simplista, mas ainda traz água ao seu moinho, está na iminência de perder qualquer pretensão emancipatória e de ser devorado pelo populismo de direita.

Original DIE HEUSCHRECKENPLAGE in Neues Deutschland, 20.05.2005

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